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Trabalho científico do HC sobre assistência em Libras, autonomia do paciente e bioética é premiado em congresso

Relato de experiência elaborado por psicóloga apresenta o caso de uma paciente surda

O relato de experiência “Libras Assegurando a Autonomia do Paciente no Direito de Decisão sobre a Realização de Procedimento Hospitalar”, elaborado pela psicóloga do Hospital das Clínicas da UFPE Mônica Mota Silveira, foi premiado no II Congresso Brasileiro de Saúde em Libras, em Juazeiro (BA). O encontro foi realizado de 30 de novembro a 2 de dezembro, às vésperas do Dia da Acessibilidade, 5 de dezembro. O HC-UFPE é uma unidade vinculada à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh).

A psicóloga destacou a alegria de ter a iniciativa do hospital reconhecida no evento científico. “A emoção se fez presente em todo o percurso; na assistência ofertada, na apresentação do trabalho e no reconhecimento por meio da premiação. Inclusão é amor”, disse Mônica Mota Silveira. “Essa premiação dá visibilidade a iniciativas e ações na saúde integral da comunidade surda por meio da disseminação da cultura surda e da Língua Brasileira de Sinais (Libras) nos mais diversos campos do fazer profissional, contribuindo de modo prático no rompimento da marginalização cotidiana vivenciada por essa comunidade”, completou.

O caso relatado é de uma paciente surda, de 33 anos, internada no HC, acompanhada por sua genitora ouvinte, com um quadro de anemia grave ocasionada por uma síndrome genética, tendo desenvolvido os quadros de feocromocitoma e um carcinoma na paratireoide. Como decorrência, ela apresentava uma doença óssea que a impossibilitava de andar cerca de quatro meses antes do internamento. Pelo quadro grave e pela necessidade da realização de cirurgias, a paciente precisava autorizar a realização de uma transfusão sanguínea.

A genitora da paciente era responsável pela comunicação entre a filha e a equipe médica, intermediando essa relação, respondendo e expressando o que a filha desejava, colocando-se, dessa forma, como detentora da tomada de decisão pela filha. Por professar uma fé que impossibilitava a realização do procedimento de transfusão sanguínea, a genitora não autorizou o procedimento. Instalando-se a partir daí um dilema bioético: Quem decide pela vida da paciente? Ela mesma ou a sua mãe?

“Era crucial considerar a autonomia da paciente e ouvi-la quanto ao seu desejo de realizar as cirurgias, mesmo com a possibilidade da realização de transfusão sanguínea, informando as peculiaridades e a gravidade do caso, a possibilidade de óbito, caso não fizesse as cirurgias, e as repercussões na sua saúde, respeitando assim, o seu protagonismo no cuidado à sua saúde”, explica Mônica Mota Silveira.

AUTONOMIA DA PACIENTE - A oferta do atendimento em Libras para a paciente, assegurando o respeito à sua decisão sobre a realização dos procedimentos virou o cerne da questão bioética. “É fundamental possibilitar um atendimento humanizado, que preserve a autonomia e respeite o direito de decidir da paciente sobre o seu tratamento de saúde, tornando-a uma agente ativa de suas decisões. Esse caso nos faz refletir sobre a urgência e importância da existência de profissionais de saúde habilitados em Libras para respeito tanto aos preceitos e princípios do SUS quanto aos princípios da Bioética”, destaca a psicóloga.

A equipe que ofertava o cuidado à paciente, nas suas diversas especialidades clínicas, não era habilitada em Libras, e, em consenso, construído com o setor jurídico do HC, definiu a importância da autonomia da paciente e a necessidade de um profissional capacitado em Libras para realizar atendimentos, explicar seu quadro de saúde e ouvi-la sobre a sua decisão.

Inicialmente, Mônica atendeu a genitora para compreender o contexto no qual a família estava inserida e acolhê-la diante do dilema vivenciado. “Mãe e filha recebiam o suporte desta comunidade religiosa que era contrária à transfusão sanguínea. A partir desse impasse e da dificuldade da equipe em entender a decisão da paciente, fui convidada a realizar os atendimentos e compreender qual seria o seu posicionamento sobre a realização dos procedimentos e a possibilidade de transfusão sanguínea, além de dar um suporte emocional. Os atendimentos foram realizados pelo período de três meses”, relatou Mônica Mota Silveira.

No terceiro mês, a psicóloga do HC recorda que a paciente expressava e afirmava o seu desejo de realizar as cirurgias e, caso houvesse necessidade, efetivar a transfusão sanguínea. “A partir da solicitação do Setor Jurídico, fizemos um atendimento conjunto da paciente com sua genitora e duas testemunhas para oficializar a decisão dela e documentá-la. À medida que conversava com a paciente sobre a sua decisão, eu perguntava à genitora o que ela havia compreendido sobre o posicionamento da filha e ela repetia verbalmente a afirmação do desejo da filha em se submeter às cirurgias e à transfusão, caso necessário”, relembra.

DESFECHO - As cirurgias foram realizadas com sucesso e sem a necessidade de um procedimento transfusional. A paciente se recuperou bem no pós-cirúrgico e iniciou fisioterapia para fortalecimento da musculatura, já que não andava havia sete meses. “Atualmente, ela continua em acompanhamento médico no HC, voltou a andar, recuperando seus movimentos e sua qualidade de vida tanto na saúde física quanto no aspecto social e emocional”, conclui Mônica Mota Silveira.

Data da última modificação: 07/12/2023, 15:30