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Descobertas cinco espécies de lagartos amazônicos; nomes homenageiam defensores da floresta e povos indígenas

Répteis são do gênero Iphisa, têm pequeno porte e possuem hábitos terrícolas

Por Ana Célia de Sá

Cinco espécies de lagartos amazônicos foram descobertas por pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em parceria com a Universidade de São Paulo (USP) e o Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) da França. Os répteis são do gênero Iphisa e ganharam nomes que prestam homenagem a pessoas e etnias que defendem a Amazônia e os povos originários, a exemplo do indigenista Bruno Pereira e da irmã Dorothy Stang, assassinados, respectivamente, em 2022 e 2005. As descobertas estão descritas em artigo publicado ontem (11) na prestigiada revista Zoological Journal of the Linnean Society. Além das espécies novas, o trabalho redefine outras duas espécies desse gênero.

As cinco novas espécies são exclusivas da Amazônia e ocorrem em diversas localidades da floresta, com áreas específicas a depender da espécie (confira abaixo). Esses animais já eram conhecidos há bastante tempo, mas não se sabia que eles representavam espécies ainda não nomeadas. “A partir deste novo artigo, reportamos que algumas populações amazônicas, antes conhecidas como Iphisa elegans, na verdade representam espécies novas”, explica o professor Pedro Murilo Sales Nunes, do Departamento de Zoologia do Centro de Biociências (CB) da UFPE e um dos autores do trabalho “Integrative taxonomy of the Iphisa elegans species complex (Squamata: Gymnophthalmidae) leads to the description of five new species”. Também assinam esse artigo Anna Virginia Albano de Mello (doutoranda em Biologia Animal pela UFPE); Renato Recoder (pesquisador da USP); Antoine Fouquet (pesquisador do CNRS); e Miguel Trefaut Rodrigues (professor emérito da USP).

As espécies Iphisa brunopereira e Iphisa dorothy homenageiam postumamente o indigenista Bruno Pereira e a irmã Dorothy Stang, ambos assassinados por atuarem na defesa da floresta e dos povos tradicionais da região amazônica. A espécie Iphisa surui homenageia a indigenista Neidinha Suruí e a etnia Paiter-Suruí. Já a espécie Iphisa munduruku presta homenagem à líder indígena Alessandra Korap Munduruku e à etnia Munduruku. E Iphisa pellegrino faz um tributo à professora Katia Pellegrino, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A docente trabalha há décadas com a família Gymnophthalmidae (onde está alocado o gênero Iphisa) e tem contribuições significativas para a sistemática do grupo. “Uma vez que o gênero Iphisa é exclusivamente amazônico e se distribui por praticamente toda a área da floresta, decidimos homenagear pessoas e etnias que estão envolvidas com a defesa deste bioma”, afirma Nunes.

“A ideia das homenagens é principalmente trazer mais visibilidade a defensores da floresta que, assim como irmã Dorothy, dedicaram e ainda dedicam suas vidas em prol da Floresta Amazônica. Também chamar atenção para os povos originários, que estão constantemente tendo que lidar com o garimpo ilegal e a destruição de seus povos e terras”, ratifica Anna Mello. No trabalho, os pesquisadores ainda redefinem a distribuição e a composição do Iphisa elegans. E o Iphisa soinii, que era uma subespécie de Iphisa elegans, foi elevado ao status de espécie. Ambos já eram conhecidos e mantiveram seus nomes.

Todas as espécies do gênero Iphisa, incluindo as duas redefinidas, são representadas por lagartos de pequeno porte (um animal adulto tem, em média, 4 cm sem considerar a cauda), com escamas lisas e brilhantes, que vivem no chão, andando pelo folhiço da floresta. Mas, individualmente, cada uma possui um conjunto de atributos exclusivos. Elas diferem umas das outras por características de escamas, órgão genital masculino (hemipênis), poros no fêmur e genética. “A nova organização que propomos mostra que as espécies têm distribuições muito mais restritas do que imaginávamos antes para o gênero. Isso certamente alterará a percepção sobre o nível de ameaça a que cada uma delas está exposta”, alerta Nunes.

PESQUISA – O estudo foi o tema da dissertação de mestrado em Biologia Animal/UFPE de Anna Mello, defendida em 2019, sob orientação do professor Pedro Nunes, o qual também é coordenador do Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal da UFPE. A identificação das novas espécies foi precedida por análise de exemplares conhecidos para o gênero Iphisa, que estão depositados em coleções zoológicas por todo o mundo. O estudo incluiu a coleta de informações sobre número, formato e posição de escamas, características dos hemipênis, tamanho e proporção de partes do corpo, além de análises moleculares do DNA de cada uma das populações.

A maior parte da pesquisa foi realizada no Laboratório de Herpetologia da UFPE, no Campus Recife, e algumas ações foram executadas na USP. O estudo ainda teve a colaboração de outras instituições no Brasil e no exterior, que cederam material por empréstimo ou receberam Anna Mello e Pedro Nunes para visitas.

Onde habitam as espécies:

Iphisa brunopereira: oeste da Amazônia, nas margens do Rio Içá (AM), no interflúvio dos Rios Napo e Putumayo, no Peru, e em planícies do Equador;

Iphisa dorothy: Amazônia Oriental e Central, apenas ao sul do Rio Amazonas, no interflúvio Purus-Madeira e Madeira-Tapajós, chegando às margens dos Rios Aripuanã e Juruena;

Iphisa surui: mais ao sul da Amazônia, no Mato Grosso e em Rondônia;

Iphisa munduruku: Amazônia Central, nas margens do Rio Abacaxis;

Iphisa pellegrino: Amazônia Central, ao sul do Rio Amazonas, apenas no interflúvio dos Rios Purus e Madeira;

Iphisa elegans: norte da Amazônia, na margem esquerda do Rio Amazonas e no Escudo das Guianas; e

Iphisa soinii: oeste da Amazônia, no Peru, Equador e no estado do Acre, no Brasil.

Mais informações
Professor Pedro Nunes

pedro.snunes@ufpe.br

Crédito das fotos:
Foto dos pesquisadores Pedro Nunes e Anna Mello:
Divulgação

Fotos das espécies de lagartos (na ordem de exibição da arte vertical):
Renato Recoder;
Miguel Trefault Rodrigues;
Ricardo Kawashita Ribeiro;
Miguel Trefault Rodrigues;
Vinícius Carvalho;
Pedro Ivo Simões;
Pedro Peloso. 

Data da última modificação: 13/09/2023, 15:17