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Acervo NuDoc- Grito

Resumo: 

A Ação Católia Rural (1967-1979) com o intuito de cativar os trabalhaores não apenas pela
carisma e ideais de seus líderes cria o boletim bimestral “O Grito no Nordeste” em 1967 para
veicular suas ideias de maneira acessível. O conteúdo do Grito deveria atender aos projetos da
instituição conhecida pelo seu trabalho de base a fim de sempre expandir sua atuação e
consequentemente integrar seus militantes. De caráter inclusivo e resistente frente ao regime
militar, as edições bimestrais tentavam aproximar as situações de dificuldades no campo com
as palavras bíblicas que acompanhavam as várias seções dos jornais. As edições também
incorporavam caráter político frente as notícias do país e medidas péssimas para a situação
dos trabalhadores rurais de maneira que informavam, conscientizavam e engajavam os
assinantes. Os abusos e violências cometidos na ditadura não contemplaram apenas do ponto
de vista trabalhista, mas também na violência intitucionalizada pelo governo em sua constante
repressão aos grupos de lutas. O “Grito” sempre denunciou estas brutalidades.
A pretensão da ACR e dos colaboradores do Grito, como expressavam em diversos jornais, era
a de se tornar porta-voz do trabalhador rural na perspectiva de corresponder a um veículo de
ideais e paradigmas enfrentados pela classe. Até 1979, o "Grito" conservou edições
extremamente longas que expressavam em suas quase 20 páginas opiniões e relatos com
temáticas de interesse camponês. Estas estavam ligadas aos avanços ou retrocessos na
legislação trabalhista, como a luta pelo direito a aposentadoria, em 1976 ou mantendo os
militantes atentos para as chamadas dos eventos como as Assembleias – oportunidade para
socializar tantas dessas preocupações e reflexões.
É importante ressaltar que a temática central dos jornais também acompanhavam as
festividades católicas ao longo do ano. Como se tratavam se edições bimestrais, por boletim
muitas das capas representavam eventos e datas importantes como Páscoa, Natal e Festas
Juninas. Em espaços no periódico existiam registros de casamentos e falecimentos de
militantes. Isso traz a perspectiva de um jornal para o povo.
As expressões utilizadas no jornal sempre remetem a um tom familiar e simples vocabulário,
algo típico quando se entende a tentativa de aproximação de consciência de luta e identificação
com a causa. Para fazer com que isso seja eficaz, o jornal traz colunas e seções que são
mantidas por todas as suas edições por seguirem estes objetivos : "Os Amigos Escrevem"
divulgam testemunhos de trabalhadores em toda a região nordeste. O tom político nos relatos e
em episódios cujo trabalhador é sempre explorado e maltratado diante de todas adversidades
traduz essa assimilação e reconhecimento pelo que a classe se submete.
Todas estas passagens seguem também um caráter religioso por possuírem "lições"
subsequentes que transmitem o "espírito católico" nestas situações de dificuldades. Para
sempre aprofundar o tema, existe a coluna também fixa "O Evangelho no Campo" cuja
proposta é de viabilizar pregações sempre com temáticas da própria ACR e suas pesquisas.
Aproximar-se do trabalhador era uma prioridade. Temas como “Família” são revisitados
constantemente e sempre atrelados a filosofia cristã e ao trabalho para sustento da casa.
Enfrentar as contadições da vida no campo é um ato de resistência movida pela palavra de
Deus, como incentiva a ACR quando procura esclarecer cada passo político no Brasil.
O “Grito” passou por muitas mudanças em todo o período que ficou em circulação, no entanto,
a mais significativa também coincidiu com um momento delicado da ACR. A Ação Católica
Rural muda suas diretrizes, abordagens e por consequência, a estética do Jornal, quando por
volta de 1979 o reformula a partir da edição no49. A transformação em si corresponde a
abertura política após a ditadura militar e a um desencadeamento e ascensão de outras forças
políticas no Brasil. As novas frentes tornam a ACR um segundo plano quando falamos da
pluralidade de lutas que afloraram e ajuda, de certa forma, a “desobistruir” a concentração de
pessoas na mesma bandeira, pois estes grupos agora tendem a escoar para outras
plataformas e estratégias.
Os líderes da ACR e os colaboradores do jornal não mudam, o que se concretiza é a mudança

do nome da instituição (agora chamada de Animação dos Cristãos no Meio Rural), apesar de já
em 1967 em seu ano de fundação, documentos como atas, relatórios já contavam com este
nome. O que podemos constatar é que somente no final da década de 1970 esse nome é
efetivado.Primeiramente, toda a disposição dos assuntos e temas vão se ajustando a um
modelo de 8 a 12 páginas sempre contendo um editorial na página central. Conteúdos sobre a
conjuntura internacional são explorados mais intensamente, além de ter uma atenção especial
a comunidade jovem e cristã rural. Existem colunas que ainda são mantidas, ainda assim é
possível observar que as críticas ao governo tornam-se mais explícitas.
Em consequência da abartura política, notamos um afastamento dos jovens das comunidades
de resistência religiosa, estes se dispersaram em outras frentes de luta de movimentos
populares ou partidos políticos. Diante desta conjuntura percebemos o jornal abordando temas
ligados a juventude católica, de maneira que aparenta quase como uma releitura das ações de
luta e suas estratégias de aproximação. Neste âmbito, ainda ganhando espaço até nas folhas
centrais do boletim também pela preocupação com a falta de empregos na zona rural,
exploração nos centros urbanos, êxodo rural, o jornal evolui até criar colunas fixas com estes
argumentos.
Aos poucos, as matérias sobre Páscoa, Natal etc. Contemplam apenas o interior do jornal e
como segundo plano. Também é possível notar como a figura do Papa é mais recorrente. Seus
discursos são analisados atentamente e, sempre que possível, enquadrados nos tópicos a que
o jornal se dedica. Fica cada vez mais comum ver a folha destinar todas as páginas de
determinadas edições como “especiais”. Isso acontece em época de aniversário da ACR ou,
por exemplo, na visita do Papa ao Brasil.
O jornal passa por todos momentos da redemocratização brasileira denunciando e contestando
as medidas neoliberais aplicadas à economia. Com a função de reanimar e informar os seus
leitoresdo que estava por vir. A miséria, corrupção e privatizações são temas amplamente
discutidos, mesmo sempre manendo o foco na situação do trablho rural e questões ligadas a
agricultura.
A chegada dos anos 2000 é um passo contínuo na história da ACR, quando a publicação já
está bastante fragilizada e diminuída do que costumava ser. Estando cada vez mais
espaçadas, a partir de 2004 elas passam a ser anuais e compilando e fazendo um aparato
geral do ano. Estes, envolvem muitas críticas ao governo Lula tratando-o como “terceiro
governo FHC”. As edições param de ser publicadas chegado o ano de 2008, na edição no186.

 

Por: Maria Gabriela Souza

Data da última modificação: 03/07/2018, 10:45