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Cultura repressiva e punitiva do legislador brasileiro não se traduz em redução de violência

O trabalho partiu da análise comparativa das experiências punitivas aplicadas no Brasil, nos Estados Unidos e na Grã Bretanha

Por Camila Sousa

O cenário sociopolítico conturbado vivido no Brasil atual aciona diversos sentimentos de insegurança e medo na população. O debate, bastante vigente, em torno de quais são as fórmulas eficientes para garantir segurança pública, constitui importante aspecto para a compreensão das formas de combate à criminalidade, além de lançar problematizações a respeito do modelo penal adotado no país. É com esse viés que a tese “A cultura punitiva na modernidade tardia: um estudo das racionalidades legislativas do Sistema Penal Brasileiro” conclui que, somente a partir da atuação efetiva do Estado a fim de adotar a prisão como ferramenta excepcional de punição, será possível erguer uma "nova cultura punitiva", que prioriza a adoção de medidas menos repressivas. 

O trabalho, defendido por Edimar Edson Mendes Rodrigues no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPE, partiu da análise comparativa das experiências punitivas aplicadas no Brasil, nos Estados Unidos e na Grã Bretanha, a partir das percepções do legislador, e contou com a orientação do professor José Luiz de Amorim Ratton. De acordo com o autor do estudo, "o rigor punitivo praticado como forma de separar os meios correto e incorreto de se portar socialmente faz com que a formulação e a atuação das leis penais por parte do legislador esteja circunscrita, na maioria das vezes, ao anseio popular, movido pela vontade de 'justiça' e na resposta imediata à diminuição da criminalidade". 

Para Edimar, é em função desse anseio social de 'castigar' o delinquente que se desenvolve a concepção de punitivismo popular, em que o legislador, atuando para atender aos interesses da sociedade, formula leis severas contra o crime e maior rigor com o criminoso. Outro conceito apresentado na tese, a modernidade tardia, também contribui para elucidar o processo multifacetado da realidade penal brasileira. "Esse ponto de vista", defende o autor, "representa os estágios de desenvolvimento das sociedades, movidos por instabilidades em todos os campos que regem a vida social, que inevitavelmente recaíram sobre as mudanças na cultura política de controle do crime". 

MÉTODO | A metodologia aplicada à construção dos dados da tese consistiu na seleção de documentos, entrevistas semiestruturadas com parlamentares (deputados federais e senadores) e observação direta realizada na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados, em Brasília. Quanto à técnica de análise, o autor do trabalho adotou também a perspectiva analítica da Teoria Fundamentada nos Dados e baseou-se em um referencial teórico que conecta a concepção de modernidade tardia com as mudanças culturais na política de controle do crime, ao criarem um cenário baseado na construção do punitivismo ou punitivismo popular. Ao mesmo tempo, procurou-se demonstrar a existência de um discurso que aponte medidas alternativas à prisão.

A pesquisa, ao trazer vivências profissionais do pesquisador no período de 2003 a 2009, em que dirigiu uma penitenciária de segurança máxima no Piauí, mostra a situação destoante entre a finalidade da pena de prisão, ou seja, a ressocialização do indivíduo e sua não reincidência ao sistema prisional. Daí a análise do pesquisador de que "o grau de hierarquia construído a partir da concepção de que a pena de prisão é adequada, dá-se tanto por ser ela considerada como punição mais rigorosa da Constituição Federal de 1988, quanto pela atuação do legislador, movida muitas vezes, pelo clamor público". Entretanto, através da visão do autor da tese, está claro que a medida de restrição de liberdade pouco influi na diminuição da criminalidade, pois os indicadores referentes ao crescimento da população carcerária brasileira aumentaram. 

Prova deste contexto foi a última atualização de dados feita pelo Ministério da Justiça, publicados no dia 26 de abril de 2016. O Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), que traz informações sobre o crescimento da população carcerária acerca dos estabelecimentos prisionais do país, concluiu que, se considerado o número de pessoas que entraram e saíram do sistema penitenciário nacional ao longo de 2014, pelo menos, um milhão de brasileiros vivenciaram a experiência do encarceramento, no período de um ano. Segundo Edimar, "ao mesmo tempo em que os dados revelam a tendência do o legislador aproximar-se da opinião pública; ainda que haja essa necessidade, a prioridade deve ser construir uma agenda de pesquisa nesse campo a fim de se chagar a medidas que deem retorno, de fato, à sociedade".

Mais informações

Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFPE
ppgs.ufpe@gmail.com
(81) 2126.8285 / 2126.8284

Edimar Edson Mendes Rodrigues
edimaredson@hotmail.com

Data da última modificação: 08/11/2017, 15:05