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Saneamento reduz impacto dos maus hábitos de higiene e da má qualidade da água no crescimento de crianças em Belo Jardim

A estatura de crianças no município não sofreu o impacto das más condições, como ocorre em outras regiões pobres e subdesenvolvidas

Por Maik Santos

Há um consenso em saúde pública de que a má qualidade da água para consumo somada a condições ruins de higiene e saneamento estão diretamente atreladas ao risco de déficit de estatura em crianças de regiões pobres e subdesenvolvidas. No entanto, no estudo “Água de Consumo, Saneamento, Prática de Higiene e Déficit de Estatura em Crianças Menores de Seis Anos”, desenvolvido com crianças do município de Belo Jardim, no interior de Pernambuco, a mestra em Saúde da Criança e do Adolescente Viviane Cavalcanti de Torres não identificou uma grande relação entre os fenômenos. 

Na pesquisa, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente (PPGSCA) da UFPE, sob orientação da professora Kátia Galeão Brandt e coorientação do professor Pedro Israel Cabral de Lira, a autora revela que, no município do Agreste pernambucano, a frequência encontrada de déficit de estatura foi de 7,2%, índice bem menor que o encontrado em estudos anteriores em regiões como Índia (48%), África (40%) e Ásia (28%). Em Belo Jardim, o déficit de estatura grave só foi identificado em cerca de 28% desses casos (5/18), que tinham idade inferior a 24 meses. De todas as crianças analisadas, 35 (14%) delas apresentaram risco de déficit de estatura.

Ao analisar apenas o grupo de crianças com déficit de estatura pelo sistema de classificação criado pela autora, os dados coletados apontam que apenas um terço destas é de famílias classificadas como possuindo condições totalmente adequadas de WASH - sigla em inglês que indica Água, Saneamento e Higiene - sendo que mais da metade (11/18) fazia uso de água de beber proveniente de carrinhos com pequenos tanques ou tambores, sem nenhum tratamento. Além disso, o estudo também identificou que a frequência de diarreia nas últimas duas semanas da pesquisa foi 10,4% no grupo total de crianças.

Diante da contradição identificada no estudo, em que as crianças estavam submetidas a situações, embora ideais de saneamento, muito precárias de água, a autora afirma que alguns trabalhos sugerem que o impacto do saneamento melhorado sobre o crescimento pode ser superior àquele gerado pela água. “É possível que os benefícios do saneamento adequado, existente no município de Belo Jardim, tenham exercido maior impacto na proteção das crianças contra a ocorrência de déficit de estatura, apesar das inadequadas condições da água de beber”, conclui.

Segundo Viviane, “o WASH está associado à ocorrência de disfunção entérica ambiental e favorecimento a doenças diarreicas, que podem levar à restrição crônica de crescimento, identificada pela baixa estatura para idade”. Do universo pesquisado e de acordo com a pesquisa, cerca de um terço das crianças eram sujeitas a condições totalmente adequadas de WASH. 

MÉTODO | Para analisar o tema, a autora realizou um estudo transversal de abordagem quantitativa com 250 crianças (134 meninos e 116 meninas) menores de seis anos cadastradas pela Estratégia Saúde da Família, residentes na zona urbana do município. A pesquisadora utilizou um formulário estruturado com informações obtidas por entrevistas realizadas com cuidadores das crianças e dados coletados a partir do comprimento/altura destas.

Em sua pesquisa, Viviane também fez uma análise da situação de cada um dos fatores que compõem o WASH (água, saneamento e higiene). O componente com maior frequência de inadequação foi a água de beber, tendo sido elevado o consumo de água não melhorada. “Apenas uma pequena parcela da população realizava algum tipo de tratamento da água de beber antes de seu consumo”, pontuou Viviane. 61% dos entrevistados informaram que consumiam água classificada como não melhorada. “Esse número é bem superior ao relatado pela OMS em 2011, quando 11% da população mundial consumia água proveniente de fontes não melhoradas”, afirma ela.

Viviane destaca o cenário do acesso à água no município do estudo. “Desde 2012, a cidade é sujeita a longos períodos de seca que comprometem a quantidade e a qualidade da água disponibilizada para a população”, informa, reforçando que a distribuição intermitente da água canalizada (provocada pelo racionamento) pode favorecer contaminações ainda na tubulação. Além disso, a falta de água faz com que as famílias necessitem armazenar água em casa, podendo levar a sua contaminação nos reservatórios domiciliares, que são frequentemente inadequados.

Quanto ao saneamento, a pesquisadora constatou a existência de uma elevada taxa de saneamento melhorado nas casas dos entrevistados do estudo e a existência de banheiros em todas as residências. E na análise sobre higiene, a maioria dos entrevistados disse realizar a lavagem das mãos com água e sabão, sendo esta prática classificada como melhorada. Entretanto, segundo ressalva a mestra, a prática de lavar as mãos após defecar foi constatada como inadequada em 25,2% das entrevistas, já que os cuidadores afirmaram não realizar este ato ou realizá-lo de maneira inadequada. “A lavagem das mãos com água e sabão é reconhecida como um dos melhores métodos para prevenção de doenças infecciosas; a não realização desta tem sido apontada como uma das principais responsável pela contaminação de alimentos e da água”, diz.

Mais informações

Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente (PPGSCA)
(81) 2126.8514
ppgsca@gmail.com

Viviane Cavalcanti de Torres
torres.viviane@hotmail.com

Data da última modificação: 03/04/2019, 10:23