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Analfabetismo

Publicado no Jornal do Commercio em 20 de setembro de 2021

Mozart Neves Ramos*

Em pleno século XXI, o Brasil ainda se debate com a questão do analfabetismo. No último dia 8 de setembro, um dia após a data da Independência, foi comemorado o Dia Mundial da Alfabetização, criado em 1967 pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) com o objetivo de discutir assuntos e questões ligados à alfabetização em todo o mundo, promovendo um amplo debate sobre a importância desse tema, principalmente em países que ainda têm taxas de analfabetismo elevadas, como é o caso do Brasil.

A alfabetização é a base de todo o processo educacional. No Brasil, ainda temos 11 milhões de 15 anos ou mais que não sabem ler e escrever uma simples frase ou fazer uma simples operação matemática. Isso corresponde a 6,6% dessa faixa populacional. No Nordeste, esse percentual salta para 13,9%. A maioria tem mais de 60 anos de idade e vive na zona rural. Isso é muito triste, porque eventualmente essas pessoas podem morrer sem ter exercido plenamente sua condição cidadã. A meta do Plano Nacional de Educação (PNE) era chegar, em 2015, à taxa de 6,5%; talvez consigamos chegar a isso agora em 2021; o principal objetivo é erradicar o analfabetismo até 2024. Mas, pelo andar da carruagem, não vamos conseguir.

Alfabetizar jovens e adultos não é uma tarefa simples, mas ela precisa ser feita. A educação, como prevê a nossa Constituição, é um direito de todos. É um dever do estado e da família oferecer, em colaboração com a sociedade, uma educação que desenvolva plenamente as pessoas ao longo da vida. E esses 11 milhões de brasileiros nem sequer conseguiram dar a largada nesse processo. Para ter êxito, é preciso um grande esforço de mobilização nacional, e quem fez isso pela última vez foi o ministro Cristovam Buarque. Pena que o pouco tempo na função não lhe permitiu o êxito esperado em erradicar o analfabetismo em nosso país.

Mas, além desses 11 milhões, há também aqueles brasileiros chamados de analfabetos funcionais - que não são capazes de compreender e interpretar um simples texto. Nesse caso, são 38 milhões - ou seja, 3 em cada 10 brasileiros na faixa etária de 15 a 64 anos encontram-se nessa condição. O país precisa olhar de modo mais atento para essa situação, pois coloca em risco o seu próprio futuro em um ambiente planetário no qual os países desenvolvidos conseguiram fazer isso há mais de um século, e agora se debruçam em questões de fronteira no campo da educação.

Por ironia do destino, o país comemora agora em setembro, e com toda a justiça, os 100 anos de Paulo Freire, o nosso mais importante educador, conhecido mundialmente pelo seu trabalho no campo da alfabetização de jovens e adultos. É preciso cada vez mais criar a "paixão" (e não apenas o hábito) pela leitura, como dizia o nosso também saudoso Ariano Suassuna. O Brasil só será verdadeiramente independente quando for capaz de oferecer uma educação plena para todos os brasileiros. Mas estamos longe disso.


*Professor emérito da UFPE e catedrático da USP de Ribeirão Preto.

Data da última modificação: 22/09/2021, 15:48

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