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Uma sociedade de estudantes

Gilson Edmar , vice-reitor da UFPE
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A Sociedade de Internos dos Hospitais do Recife (SHIR), a mais antiga sociedade de estudantes de medicina, foi fundada em 1926 pelo pioneirismo de Gildo Neto, então estudante da recém-criada Faculdade de Medicina do Recife. O objetivo era estimular a pesquisa entre os estudantes, pois tinha como critério de admissão como sócio a apresentação e defesa de um trabalho científico inédito. Foi a precursora do programa de iniciação científica, hoje adotado em todas as universidades. Funcionou ininterruptamente por 80 anos. É um fato inédito. Durante todo este tempo, seus dirigentes organizaram, anualmente, cursos de atualização para estudantes, além da sua atividade principal, o Congresso Médico-Acadêmico Estadual. No evento, eram realizadas palestras ministradas pelos professores, com temas atuais na época e de interesse na formação dos jovens.
 
Entretanto, os destaques nos congressos eram as sessões de apresentação e defesa dos trabalhos científicos. Eram convidados professores para compor uma banca examinadora e, dependendo da área onde era desenvolvida a pesquisa, um especialista completava a comissão julgadora. Um dos autores fazia a apresentação e, em seguida, era sabatinado pelos mestres. Era um grande estresse para os jovens, mas um enorme aprendizado para a vida futura. Os trabalhos eram classificados em duas categorias: área básica e área clínica. Os primeiros lugares ganhavam prêmio e diploma para o currículo incipiente. Todos os autores eram admitidos como sócios da SIHR.
 
Com esta formatação do congresso, desenvolvia-se uma salutar disputa entre as disciplinas das faculdades de medicina, para que seus alunos ganhassem o primeiro lugar. Os serviços orientavam o desenvolvimento da pesquisa e a forma de escrever o trabalho e também treinavam para a apresentação e a defesa, tudo dentro dos princípios da metodologia científica.
 
Ao entrar na Sociedade de Internos, fui secretário-geral e, em seguida, presidente quando ela completou 40 anos de fundação. Foi uma festa inesquecível, com uma missa celebrada por d. Helder Câmara, na Sociedade de Medicina de Pernambuco, que emprestava sua sede para que SIHR se instalasse. No dia seguinte, houve um almoço no Clube Internacional, onde conseguimos trazer vários ex-presidentes, inclusive o segundo presidente da Sociedade de Internos, o dr. Costa Pereira, que sucedeu Gildo Neto, o fundador falecido precocemente.
 
Os sócios e os diretores da SIHR destacaram-se na vida profissional e acadêmica. Foram incontáveis os médicos que por lá desenvolveram suas ações enquanto estudantes, pois ao colarem grau deixavam de pertencer ao quadro associativo. Ao longo dos seus 80 anos a SIHR teve como presidentes, entre outros, o autor deste artigo, além de Ian Pester, Fernando Ventura, Marcelo Paranhos, Alexandre Arraes, Othon Bastos, Laércio Valença, Fernando Almeida e Vamberto Moraes.
 
No início da década de 60, o professor Eduardo Wanderley Filho fez um discurso de cunho social na abertura do Congresso da SIHR, transcrito na íntegra no livro de atas. Com o movimento militar, esse livro passou a ficar sob a guarda do presidente. Era o livro de capa preta. O presidente o entregava ao eleito, com a finalidade de preservar a história de nossa sociedade e evitar sua destruição. Com a criação do Programa de Iniciação Científica, a SIHR perdeu sua principal atividade, perdendo também o interesse dos jovens estudantes, pois o Programa de Iniciação Científica (Pibic) é institucional e a apresentação dos trabalhos nos seus congressos (Conic) é obrigatória. Mas a Sociedade de Internos pode desenvolver outras atividades paralelas, do ponto de vista científico.
 
Esta é a minha história na SIHR. Cada um dos antigos sócios tem também a sua. É preciso que todos do Recife conheçam a história da sociedade. Os documentos se perderam, por isso é necessário recuperar sua memória através da comunicação oral. Conclamo a todos os médicos, que por lá passaram e que ainda nutrem uma grata recordação da nossa SIHR a unir-se para estimular os estudantes das nossas faculdades a reativá-la. Que a Associação Médica de Pernambuco se associe a esse projeto, pois abrigou a SIHR em sua sede, durante quase toda a sua existência. Não deixemos morrer uma sociedade de estudantes de 80 anos, pioneira no estímulo à pesquisa científica. Façamos uma corrente de apoio à nossa Sociedade de Internos dos Hospitais do Recife.
 
Publicado em 26.06.2007 no Jornal do Commercio
Data da última modificação: 31/10/2016, 11:18

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