Pesquisa fornece uma base científica inédita para criar políticas públicas de monitoramento costeiro, planejar ações de mitigação e limpeza e compreender os riscos à biodiversidade e à saúde humana
Pesquisadores ligados a 15 instituições brasileiras, incluindo a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), da Espanha, Estados Unidos, México e Argentina, produziram o maior levantamento sobre microplástico (MP) em sedimentos de praias tropicais. O estudo indica que o Brasil enfrenta uma poluição disseminada por esse poluente ao longo de todo o seu litoral e que há regiões críticas comparáveis a áreas muito industrializadas do mundo. A pesquisa também fornece uma base científica inédita para criar políticas públicas de monitoramento costeiro; planejar ações de mitigação e limpeza e compreender os riscos à biodiversidade e à saúde humana. Os resultados foram divulgados no artigo “Microplastic pollution across the Brazilian coastline: Evidence from the Micromar project”, publicado na revista Environmental Research.
O trabalho faz parte do projeto Micromar, criado para mapear a poluição por MPs nas praias do Brasil. Foram analisadas 4.134 amostras de 1.024 praias ao longo de aproximadamente 7.500km da costa brasileira em 17 estados e 211 municípios, abrangendo mais de 90% do litoral brasileiro. O objetivo foi medir quanto MP existe nas areias; identificar que tipos de plástico predominam; avaliar riscos ambientais e ecológicos; e descobrir quais fatores (urbanização, rios, esgoto, turismo etc.) influenciam essa poluição.
ABRANGÊNCIA - A professora Betânia Melo, do Departamento de Bioquímica da UFPE, que participou do estudo, explica por que a pesquisa tem grande relevância e repercussão nacional e internacional. “Os dados obtidos são alarmantes e preocupantes, pois a poluição por MPs representa riscos associados à biodiversidade e à saúde humana. Essa pesquisa representa o maior levantamento costeiro de MPs no hemisfério sul e oferece, além de um banco de dados abrangente e sem precedentes, uma estrutura metodológica que pode ser replicada e uma agenda de prioridades a serem consideradas para a conservação das zonas costeiras brasileiras frente a crescente poluição plástica”, detalha a pesquisadora.
Os índices de risco ecológico e de poluição mostraram que as regiões Sul e Sudeste têm os maiores níveis de risco e que alguns pontos no Nordeste (PI, MA, SE) também apresentam altos valores. Os modelos estatísticos mostraram que a poluição por MP é mais intensa quando há proximidade de esgoto e rios urbanos; maior urbanização e turismo; largura de praia maior (mais área para retenção de plástico); alto índice de “pressão plástica” (produção, consumo e descarte local). Locais mais afastados de áreas urbanas, com areia grossa e menos infraestrutura, tiveram menos contaminação.
CONTAMINAÇÃO - As coletas ocorreram entre abril de 2022 e abril de 2023 e incluíram amostras de areia retiradas em até 5 cm de profundidade, sempre na faixa de maré alta. Os MPs (de 300µm a 5mm) foram extraídos por separação em solução densa e identificados por microscopia e espectroscopia Raman, que reconhece o tipo de polímero. Quanto à presença de microplásticos, constatou-se que 69,3% das praias estavam contaminadas. A ocorrência variou de 16,5% (Espírito Santo) a 90,6% (Sergipe). Foram encontrados 24.549 fragmentos de plástico com predominância de fragmentos brancos, verdes e azuis. Os principais polímeros identificados foram polietileno (PE), presente em embalagens plásticas, sacolas, polipropileno (PP), encontrado em tampas, cordas, fibras, e isopor (EPS), que pode ter origem em embalagens de comida, caixas de pesca.
A concentração variou de 0 a 3.483 microplásticos por quilo de areia (MP/kg) com uma média nacional de 27,09 MP/kg. Os estados com maiores níveis são o Paraná, Sergipe, São Paulo e Pernambuco. Os pontos críticos foram encontrados nos municípios de Pontal do Paraná (PR), Recife (PE), Praia Grande (SP), Aracaju (SE). As praias mais contaminadas são Barrancos (PR), Olinda (PE) e Guilhermina (SP).
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Professora Betânia Melo
maria.bmoliveira@ufpe.br