Uso da alimentação como ferramenta pedagógica aproxima os estudantes do conteúdo escolar
Por Luisa Sobral
Utilizar receitas culinárias em sala de aula é uma ferramenta eficaz para melhorar a qualidade das aulas de História. É o que mostra a dissertação de mestrado da pesquisadora Ana Francisca de Lima Alves, defendida, em 2024, no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). O estudo propõe o uso da História da Alimentação como recurso didático no ensino de História, com foco nos anos finais do Ensino Fundamental.
A pesquisa, intitulada “Das Cozinhas Pernambucanas para as Salas de Aula: contribuições da História da Alimentação para o Ensino de História”, parte do princípio de que os alimentos e seus modos de preparo não apenas revelam aspectos culturais e afetivos, mas também podem ser utilizados como fontes históricas em sala de aula. Com isso, a autora analisa como a História da Alimentação pode contribuir para o ensino da disciplina, usando receitas como linguagem histórica.
A dissertação, que teve Renan Marques Birro como professor orientador, parte da análise de dois tipos de material: obras clássicas sobre alimentação e livros didáticos utilizados na rede pública de ensino. A autora analisou, principalmente, as receitas do bolo de rolo pernambucano e da cocada, presentes no livro “Açúcar: uma sociologia do doce, com receitas de bolos e doces do Nordeste do Brasil”, de Gilberto Freyre, e as examinou como fontes históricas, observando seus ingredientes, modos de preparo e contextos culturais. Em seguida, estabeleceu conexões entre essas receitas e os conteúdos trabalhados na coleção didática “Araribá Mais: História”, aprovada pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD). O cruzamento dessas fontes permitiu refletir sobre o potencial da linguagem culinária para enriquecer o ensino de História e contribuir para uma aprendizagem mais próxima da realidade dos estudantes.
Com abordagem aplicada e exploratória, a pesquisa também realiza uma análise qualitativa dos conteúdos, utilizando como base teórica autores como Jean-Louis Flandrin, Massimo Montanari e Laurence Bardin. Além disso, a dissertação está vinculada à linha de pesquisa “Saberes Históricos: teoria, ensino e mídias”, que investiga usos da História em práticas socioculturais e suas relações com diferentes linguagens.
A pesquisa identifica que, apesar de os alimentos aparecerem nos livros didáticos, muitas vezes, são tratados de forma superficial ou desconectada do contexto sociocultural. Ao propor as receitas como ferramenta didática, a autora argumenta que esse tipo de fonte pode aproximar o ensino da realidade dos alunos, ajudando-os a compreender que todos são sujeitos históricos e que a História não se limita a guerras e datas, mas está presente nos hábitos, nos sabores e na rotina.
“A temática da alimentação tem essa potencialidade de mostrar que a História vai para além dos fatos políticos e econômicos”, afirma a autora. “Ela está inserida no dia a dia, na vestimenta, na alimentação, no ato religioso. É olhar a História por um ângulo de maior proximidade e assim se sentir inserido dentro do processo historiográfico. É aquela História que aproxima o estudante do objeto de estudo”, completa.
Ana Francisca destaca ainda que o estudo vai ao encontro das diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que recomenda o uso de múltiplas fontes e linguagens no ensino de História, incentivando a abordagem de temas relacionados ao cotidiano e à cultura alimentar como forma de despertar o interesse dos estudantes.
A autora também chama atenção para a importância da preservação das tradições alimentares regionais. Pratos como o bolo de rolo, o cuscuz e a tapioca, por exemplo, são apresentados na pesquisa não apenas como elementos da cultura gastronômica, mas como expressões da história social de Pernambuco.
Por fim, a dissertação argumenta que incorporar a alimentação como objeto de ensino pode representar um avanço qualitativo nas práticas pedagógicas da disciplina de História. Além de contribuir para a preservação da memória cultural, essa abordagem oferece aos educadores uma alternativa concreta para tornar as aulas mais envolventes e próximas das vivências dos alunos. “A disciplina de História é considerada, por muitos alunos, como monótona, desinteressante. Fazer com que ela se aproxime do estudante é capaz de tornar mais prazerosas essas aulas”, conclui a pesquisadora.
Mais informações
Programa de Pós-Graduação em História da UFPE
(81) 2126.8292
ppghistoria@ufpe.br
Ana Francisca de Lima Alves
anafranciscaalvesdelima@gmail.com