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Entre fronteiras e resistências: projeto fortalece mulheres migrantes negras em Pernambuco
Projeto do mês
A Universidade Federal de Pernambuco é o espaço onde se desenvolve um projeto de extensão que busca compreender, registrar e enfrentar as múltiplas opressões que atravessam a vida de mulheres migrantes negras em diáspora no Brasil. Constituindo-se uma iniciativa do Laboratório de Educação das Relações Étnico-Raciais da UFPE (LABERER), liderado pela Profa. Maria da Conceição dos Reis, Mulheres Migrantes Negras em Diáspora no Brasil: Cartografias das Opressões integra uma proposta nacional coordenada pela Universidade de Brasília e, desde seu início, tem se destacado não só pela relevância temática, mas também pelo cuidado metodológico e pela criação de espaços de acolhimento e reflexão coletiva.
(Site do LABERER, s/d)

Logo do LABERER
Segundo a coordenadora do projeto, Amanda Ganimo, que também atua como Diretora de Ações Afirmativas da UFPE, implantá-lo em Pernambuco exigiu um esforço inicial significativo para alcançar as mulheres que dele participariam. “Um dos maiores desafios iniciais foi a seleção das mulheres migrantes, já que há poucas redes organizadas que reúnem essas mulheres no estado”, explica. A ausência dessas redes reflete o próprio isolamento vivenciado por muitas mulheres migrantes, que frequentemente enfrentam barreiras linguísticas, culturais, econômicas e emocionais. Ainda assim, o projeto conseguiu reunir dez mulheres como bolsistas, representando diferentes trajetórias, países e histórias de vida.
(Lucas Emanuel, 2025)

Amanda Ganimo, coordenadora do projeto
Uma das mulheres bolsistas, que preferiu não ter o nome divulgado, conta que a experiência do projeto tem permitido a ela unir sua trajetória pessoal à acadêmica. Ela explica que a motivação de participar do projeto foi viver uma atividade fora do seu universo acadêmico em Engenharia e que o projeto despertou o desejo de encontrar outras mulheres com histórias semelhantes: “Como mulher africana vivendo no Brasil, muitas das temáticas abordadas fazem parte da minha própria vivência”.
Essas vozes demonstram a centralidade da dimensão humana e afetiva que orienta o trabalho desenvolvido. O projeto parte da compreensão de que as mulheres migrantes negras carregam consigo marcas profundas de desigualdades estruturais, atravessadas por raça, gênero, classe, nacionalidade e status migratório. Essas camadas se entrelaçam e criam trajetórias marcadas por discriminação, exclusão e violações de direitos. Para a bolsista, isso se expressa de maneira concreta no cotidiano: “Os desafios mais marcantes são o racismo, a xenofobia e a dificuldade de inserção social e profissional. Também muitas das mulheres migrantes enfrentam barreiras linguísticas, falta de reconhecimento de seus diplomas e ausência de políticas públicas que garantam acolhimento efetivo. Além disso, o isolamento e a falta de redes de apoio tornam o processo de adaptação ainda mais difícil”.
O projeto não se propõe apenas a identificar esses desafios, mas a compreendê-los desde dentro, a partir da escuta qualificada das mulheres e do diálogo coletivo. Essa escuta se articula à proposta de fortalecer a formulação de políticas públicas que atendam às especificidades dessa população, especialmente no campo da saúde. Para isso, o projeto articula ações de educação permanente voltadas aos profissionais da atenção primária do Sistema Único de Saúde (SUS), promovendo reflexão e sensibilização sobre raça, gênero e migração. Como destaca Amanda: “O diálogo, quando mediado por confiança e respeito, se transforma em ferramenta de empoderamento e ação política”.
A metodologia adotada pelo projeto amplia essa potência transformadora ao integrar linguagens imagéticas ao processo investigativo. O Método do Projeto Vidas Paralelas combina fotografia, narrativas e análise coletiva para estimular a expressão de sentimentos, histórias e memórias. A coordenadora destaca: “Através das imagens, das discussões em grupo e da análise de documentos sobre direitos humanos, conseguimos refletir e compartilhar histórias e emoções. Esse processo fez com que a fala se tornasse mais fluida e participativa, permitindo que cada mulher se reconhecesse como sujeito da própria história e agente de transformação”.
(Amanda Ganimo, 2024)

Estudos do projeto
Refletindo sobre as ações do projeto, a bolsista destaca: “As oficinas [de direitos humanos e fotografia] têm sido espaços de libertação e autoconhecimento. Através dos direitos humanos, as participantes passaram a reconhecer seus valores, seus direitos e sua potência coletiva. Já a fotografia tem possibilitado expressar sentimentos e narrativas que muitas vezes são difíceis de traduzir em palavras”. As fotografias produzidas tornam-se, assim, não apenas registros estéticos, mas materializações simbólicas de vivências que por vezes haviam sido silenciadas.
Esses espaços de criação e diálogo também revelam a importância da construção coletiva do conhecimento. As oficinas tornam-se ambientes de convivência, produção de sentido e elaboração de estratégias de resistência. Para a bolsista, participar desse processo tem provocado mudanças internas profundas: “Aprendi a valorizar ainda mais a coletividade, a escuta e o compartilhamento de histórias. Foi quase uma terapia para mim. Trouxe alegria contar minha história e identificar-me com outras mulheres. Senti que não estou sozinha”. Assim, no campus Recife da UFPE, o projeto tem promovido a formação de laços e o fortalecimento do diálogo intercultural, fomentando novas amizades e possibilitando o sentimento de bem-estar.
A criação de uma Rede de Mulheres Migrantes Negras de Pernambuco é um dos desdobramentos esperados do projeto, conectando diferentes iniciativas e incentivando novas lideranças. Para a coordenadora, essa rede representa um espaço essencial de resistência, planejamento e ação política, sendo compreendida como “um espaço de diálogo político e coletivo, fundamental para fortalecer a luta por direitos”. Essa abordagem valoriza a perspectiva interseccional como um eixo fundamental do projeto. Para Amanda, compreender a vida das mulheres migrantes exige reconhecer como diferentes dimensões da existência, como raça, gênero, classe e migração, se cruzam e produzem desigualdades específicas. A bolsista também percebe esse aprendizado como uma transformação pessoal importante: “Tornei-me mais consciente das interseccionalidades que atravessam nossas vidas e de como podemos usar o conhecimento acadêmico como instrumento de mudança social”.
(Equipe do projeto, s/d)

Equipe do Mulheres Migrantes Negras em Diáspora no Brasil: Cartografias das Opressões
A realização do projeto dialoga profundamente com o Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro. A coordenadora considera que a data não é apenas um marco de memória, mas um chamado à continuidade das lutas: “[...] o 20 de novembro não se limita à memória da resistência Zumbi e Dandara, mas se estende às lutas contemporâneas das mulheres negras, inclusive migrantes, que continuam construindo caminhos de liberdade e dignidade”. A bolsista reforça essa perspectiva ao deixar uma mensagem para outras mulheres migrantes: “Mesmo diante das dificuldades, não podemos esquecer a força que nos trouxe até aqui”.
Entre os resultados esperados pela equipe do Mulheres Migrantes Negras em Diáspora no Brasil, destacam-se a ampliação da visibilidade das opressões enfrentadas por mulheres migrantes negras, a produção de conhecimento para subsidiar políticas públicas e o fortalecimento dos processos de resistência e participação social. O projeto também espera difundir a linguagens imagéticas e artísticas enquanto dispositivos para produção de conhecimento, reflexão e inclusão social, além de contribuir para a transformação das práticas institucionais dos serviços públicos. Ao integrar produção acadêmica, criação artística, educação em saúde e participação comunitária, o projeto reafirma o compromisso da UFPE com a promoção dos direitos humanos, da justiça social e da equidade racial.
O trabalho realizado pela equipe do projeto, no contexto das ações do LABERER, demonstra que, quando mulheres que cruzam fronteiras se encontram, suas histórias deixam de ser trajetórias isoladas para se tornarem caminhos coletivos de força, resistência e esperança. Esse movimento, feito de vozes diversas e memórias compartilhadas, fortalece a presença e a luta das mulheres migrantes negras em Pernambuco e no Brasil.
Para saber mais:
Site do LABERER: https://sites.ufpe.br/laberer/