Elias Ricardo de Oliveira demonstrou, em sua tese científica, como ideias do cientista Jesús Martín-Barbero, dos Estudos Culturais Latino-Americanos, podem dar base para explicar e realizar práticas de transparência pública, controle social e participação cidadã através de iniciativas do sistema Alerta Celular, da utilização das câmeras corporais e de reconhecimento facial

Cientista e profissional da área de segurança pública, Oliveira atua há mais de 20 anos no campo de políticas públicas
O pesquisador Elias Ricardo de Oliveira, do Programa de Pós-Graduação em Administração (Propad), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), sinaliza, na tese “Novas Tecnologias de Gestão no Contexto da Governança da Segurança Pública: uma análise a partir dos Estudos Culturais”, para a importância dos Estudos Culturais Latino-Americanos no desenvolvimento de transparência e controle social da segurança pública em Pernambuco.
Através de análises dos programas Pacto Pela Vida e Juntos pela Segurança, o doutor em Administração pela UFPE apontou bases e o que ele chama de “sinais positivos de evolução tanto no campo científico quanto no político” em relação às políticas de Estado sobre aspectos das seguranças públicas pernambucanas.
“O surgimento de novas tecnologias de gestão na segurança pública - como o sistema Alerta Celular, câmeras corporais e reconhecimento facial - têm mostrado potencial significativo. Paralelamente, vemos o fortalecimento de agendas de governança e participação social. Entendo que ainda temos oportunidades de melhoria, particularmente no que se refere à transparência e à criação de mecanismos mais contínuos de escuta social, tanto no cenário nacional quanto aqui em Pernambuco”, diz.
Oliveira tem uma trajetória de décadas dentro do campo da segurança pública. Ele atua, por exemplo, como professor universitário, realiza formações sobre Direitos e iniciativas educacionais nas políticas públicas de polícias (Civil e Militar) de Pernambuco, além do Ministério da Justiça. O doutor conta que a realidade do seu campo de trabalho foi um desafio e motivou a pesquisa na UFPE.
“Minha motivação nasce da experiência prática de duas décadas no serviço público estadual, especialmente na área de formulação e implementação de políticas públicas. Essa vivência cotidiana me permitiu observar a importância fundamental da governança para qualificar nossos processos de planejamento, execução e avaliação na segurança pública. Acredito que a pesquisa aplicada pode ser uma ferramenta valiosa para aprimorar nosso trabalho”, defende o cientista.
A tese de Elias buscou compreender a forma como as novas tecnologias de gestão são debatidas nas mídias sociais digitais, especificamente no contexto da governança da segurança pública. O doutor em Administração pela UFPE explica que o estudo se deu pelas ideias dos estudos culturais latino-americanos e teve ênfase no chamado mapa das mediações culturais do cientista, com atuação em áreas como Comunicação e Cultura, Jesús Martín-Barbero.
“Nosso estudo analisou como tecnologias de gestão da segurança pública, a exemplo do programa Alerta Celular, são percebidas e debatidas pela sociedade. A partir de uma metodologia qualitativa, inspirada nos Estudos Culturais Latino-Americanos, examinamos interações das redes sociais para compreender reações da população”, argumenta Elias.
O pesquisador da UFPE afirma que a pergunta central de sua tese foi: “como as novas tecnologias de gestão na segurança pública e defesa social são representadas, debatidas e resistidas na sociedade contemporânea, em um contexto de governança em segurança pública e influenciadas por mídias sociais digitais?” Para responder o questionamento, Oliveira conta que, através de análises, o trabalho demonstrou que, mesmo com a ausência de mecanismos formais de participação da sociedade nas questões que envolvem as novas tecnologias de gestão na governança da segurança pública (o Programa Alerta Celular, por exemplo), a população busca alternativas digitais para se manifestar sobre essas políticas públicas.
O doutor em Administração pela UFPE ressalta que “as mídias sociais emergem como espaço de contrapoder” e isso permite que a sociedade civil exerça o que ele chama de “um papel ativo na discussão a respeito dessas políticas públicas [de segurança], ainda que de forma não oficial”. Segundo Elias, esse tipo de participação pode ser configurada como “cidadã e não institucionalizada” e, a partir dela, há uma demonstração da capacidade das mídias sociais em uma perspectiva de dispositivos que envolvem tecnologias da informação e comunicação no novo espaço da governança digital.
“A participação social nesses debates podem gerar soluções mais efetivas contra a violência e para a transparência das políticas públicas. O estudo também indica que canais formais de comunicação fortalecem a governança da segurança pública”, reforça Oliveira.
Elias adverte que “o cenário nacional nos mostra a urgência deste tema” e que “Pernambuco está entre os estados que ainda apresentam taxas elevadas de mortes violentas”. O pesquisador acredita que outros estudos são importantes para “que possam sugerir aperfeiçoamentos estruturais no ciclo de políticas públicas de segurança” e os objetivos deles devem enfatizar o fato de que “não são apenas desejáveis, são essenciais para proteger nossa população”, sustenta o pesquisador.
TEORIA DAS MEDIAÇÕES - Jesús Martín-Barbero foi um espanhol naturalizado colombiano e era reconhecido como um dos principais teóricos no contexto dos Estudos Culturais, especialmente no avanço do campo da comunicação e no pensamento comunicacional latino-americano.
As teorias do cientista buscam transcender a análise informativa com relação aos meios de comunicação para adotar uma perspectiva centrada em mediações. A abordagem culturalista dele proporciona a chamada “interconexão entre produtores, produtos e receptores, ao serem examinados os deslocamentos de significados que ocorrem entre essas instâncias”, destaca o trabalho de Elias.
“Sua ênfase recai na mudança do enfoque da produção para a recepção, delineando um circuito que [re]codifica os sentidos sociais ao longo do processo comunicativo. O pesquisador Manuel Martín Serrano introduziu pela primeira vez o conceito de mediações, e mais tarde, Jesús Martín-Barbero incorporou parte dessa concepção à sua perspectiva de comunicação e cultura”, salienta o pesquisador.
De acordo com os dados de Oliveira, as ideias e os aspectos definidos por Martín-Barbero avançaram na busca de transcender e ir além dos meios de comunicação tradicionais para explorar as mediações culturais – fato este que aconteceu como uma forma de investigar processos de formação da chamada cultura de massa a partir de mudanças nas culturas populares.
AVANÇOS NA SEGURANÇA – O pesquisador da UFPE reconhece avanços nas políticas públicas de segurança em Pernambuco. Um exemplo que ele cita é o Plano Estadual de Segurança Pública e Defesa Social 2023–2030 (Juntos Pela Segurança). Através dele, diretrizes de modernização, integração de dados e criação de observatórios foram regularizadas no estado.
Dados do doutor em Administração pela UFPE dizem que “o plano estabelece metas ambiciosas, como a redução de 30% em homicídios, crimes patrimoniais e violência contra a mulher até 2026”. Oliveira acredita que há fortalecimento no cenário com investimentos em tecnologia e gestão por resultados.
“Exemplo prático foi o pacote tecnológico implementado no Carnaval 2024, que combinou bodycams, reconhecimento facial, drones e espelhamento de câmeras. Isso demonstra como podemos incorporar soluções tecnológicas de forma efetiva, sempre mantendo o debate sobre direitos e possíveis vieses algorítmicos”, singulariza.
Para o pesquisador da UFPE, Pernambuco tem se consolidado no ramo da segurança pública com os programas Pacto Pela Vida e Juntos Pela Segurança.
“É animador observar a difusão nacional de programas similares - como o próprio Alerta Celular (em diversos estados), Cadastro Inteligente/Recupera (ES) e Celular Seguro (União). Vemos também experiências promissoras com bodycams (com pioneirismo em SP) e expansão do videomonitoramento”, finaliza.
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elias.oliveira@ufpe.br